Teoria da Mudança e Resultados
A teoria de mudança é uma ferramenta que auxilia no planejamento de projetos e intervenções socioambientais. Seu objetivo central é articular, de forma clara e lógica, a conexão entre as atividades planejadas/realizadas e os resultados socioambientais pretendidos. A estrutura da teoria da mudança considera insumos, atividades, produtos, resultados e impactos. Adotamos o critério de relacionar todos os impactos para a sociedade a alguma meta dos 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODSs).
As cinco etapas de uma teoria de mudança
Recursos humanos, físicos e financeiros | Linhas de ação e programas de intervenção | Produtos e serviços orfetados à população-alvo | Mudanças tangíveis em variáveis-chave relacionadas à atividade focal e valorizadas pela população-alvo | Transformações sociais mais amplas causadas pela intervenção |
Fonte: Insper Metricis (2020).
Conceitualmente, insumos, tais como recursos ou capacidades de qualquer natureza, são a base para a realização de atividades, as quais constituem as linhas de ação de uma intervenção; atividades geram, então, produtos (outputs) disponibilizados à população-alvo. Por exemplo, numa intervenção que vise à promoção de melhores práticas de gestão em escolas públicas, professores bem treinados e práticas de gestão bem estabelecidas são alguns potenciais insumos. Utilizando esses insumos, é possível desenvolver atividades, tais como aulas mais interessantes e estimulantes aos alunos ou programas de treinamento que busquem transmitir as boas práticas de gestão aos gestores das escolas públicas participantes. Como produtos dessas atividades, pode-se citar, por exemplo, o número de vagas em escolas públicas com ensino de melhor qualidade e gestão mais eficiente.
Os produtos, por sua vez, engendram resultados (outcomes) mais diretamente ligados às atividades realizadas, além de transformações sociais mais amplas. O primeiro tipo de resultado, denominado de resultado da atividade, consiste nas transformações mais diretas sofridas pela população-alvo como consequência dos produtos disponibilizados pela intervenção. Dado o produto “número de novas escolas que adotam melhores práticas de gestão, pedagógicas e de suporte aos alunos”, um possível resultado associado seria “alunos são engajados nas atividades e possuem habilidades socioemocionais e culturais fortalecidas.” Em outras palavras, produtos não descrevem transformações induzidas pela intervenção; para avaliar transformações, é preciso considerar resultados gerados pelos produtos. Por fim, na última etapa de uma teoria de mudança são descritos os resultados à sociedade, isto é, transformações sociais mais amplas induzidas pela intervenção –– e, em geral, decorrentes dos resultados de atividades.
Nesse processo, um aspecto importante é a diferenciação entre produto e resultado. Os produtos estão diretamente relacionados às atividades e, portanto, permanecem sob o controle de quem as realiza. Os resultados, por outro lado, dependem das reações dos beneficiários e participantes. Por exemplo, em uma intervenção com escolas públicas, pode-se garantir a oferta de aulas com maior qualidade; porém, não se pode garantir que o aprendizado será, de fato, melhor. Esse resultado depende não apenas das respostas dos alunos às aulas, mas também de inúmeros outros fatores que fogem ao controle dos responsáveis pela implementação da intervenção.
Uma vez estabelecidas as teorias de mudança de cada um dos 9 temas trabalhados1, o próximo passo consistiu na integração destas a fim de formar uma ampla teoria de mudança que mapeie os fluxos lógicos de todas as intervenções. Nessa teoria de mudança consolidada, evidenciam-se as inter-relações entre diferentes temas. Por exemplo, o acesso à melhor moradia pode ter impactos positivos sobre a saúde pública2. De maneira similar, intervenções que promovam atividades de lazer e esporte podem melhorar o desempenho escolar dos jovens3). Vale ressaltar que essa complexidade, consequência das relações transversais existentes entre os diversos macro temas, é uma característica marcante de intervenções bem sucedidas em espaços urbanos vulneráveis. Portanto, um painel de indicadores bem estruturado deve, necessariamente, capturar todas essas inter-relações, motivo pelo qual a construção de uma teoria de mudança consolidada se torna um passo essencial.
A seguir os 37 resultados sugeridos pela teoria de mudança consolidada foram agrupados em quatro categorias amplas: oportunidades, qualidade de vida, convivência e governança, e infraestrutura. Representam, dessa forma, pilares para acompanhar os resultados de intervenções em áreas urbanas vulneráveis.
Oportunidades
Qualidade de vida
Convivência e Governança
Infraestrutura
R5
Desenvolvimento da primeira infância
R2 R3 R37
Aprendizado e fluxo escolar
R1
Engajamento escolar e habilidades socioemocionais
R34
Ingresso no Ensino Superior
R4 R13 R15
Empregabilidade e Empreendedorismo
R16
Renda e equidade
R22
Acesso a crédito
R7 R35
Acesso a saúde básica e desenvolvimento de hábitos saudáveis
R8 R9
Saúde e planejamento familiar
R10 R11
Atenuação de doenças, internações e óbitos
R21
Valorização e retenção das propriedades
R23 R24 R25
Redução de criminalidade e violência
R26 R27
Sensação de segurança e confiança na polícia
R6 R14
Empoderamento e pertencimento comunitário
R12 R32
Participação política e cidadania
R36
Acesso a serviços públicos com baixo custo de transação
R33
Acesso a lazer, cultura e esporte
R17 R20
Melhores condições habitacionais
R18 R31
Espaços públicos de qualidade, limpos e acessíveis
R19
Acesso a saneamento básico, energia e redes de comunicação
R28 R29 R30
Transporte público e de qualidade
Na categoria de oportunidades, reúnem-se, essencialmente, os resultados de atividade mais diretamente associados aos temas de educação e emprego e renda. Nesse sentido, a acima sugere que intervenções em áreas urbanas vulneráveis cujo foco seja a promoção de oportunidades aos moradores do território devem monitorar resultados ligados, por exemplo, ao desempenho e engajamento escolar, capacitação profissional e acesso a crédito. A segunda categoria representada é qualidade de vida. Essa categoria compreende resultados que influenciam diretamente o bem-estar dos moradores do território. Inclui, portanto, diferentes dimensões, tais como saúde (e.g., acesso à saúde básica; saúde e planejamento familiar), segurança (e.g., redução da criminalidade e violência; sensação de segurança e confiança) e moradia (e.g., valorização da propriedade de imóveis).
A categoria convivência e governança, por outro lado, contém resultados ligados à governança do território, tais como o empoderamento e pertencimento comunitário, além do exercício da cidadania. Relaciona-se, ainda, nessa mesma categoria, o acesso dos moradores a lazer e cultura, que contribui fortemente para a melhoria da convivência no território. Por fim, a última categoria, infraestrutura, reúne uma série de resultados associados aos temas de infraestrutura e moradia. Destacam-se, nessa categoria, o acesso dos moradores ao saneamento básico, à energia elétrica, às comunicações, ao transporte de qualidade e a boas condições de moradia.
A Figura acima indica, por fim, quais são os ODSs associados a cada uma das quatro categorias anteriormente descritas. Nota-se que alguns ODSs estão associados a mais de uma categoria. Por exemplo, o ODS 11, relacionado à construção de cidades e comunidades mais inclusivas, seguras, resilientes e sustentáveis (ver Tabela A5.1, Apêndice C), aparece tanto na categoria de qualidade de vida quanto nas de infraestrutura e convivência e governança. Outros ODSs são mais específicos a uma dada categoria, como é o caso do ODS 13 (“Ação conta a mudança global no clima”), o qual está relacionado à categoria de infraestrutura.
Esse quadro de categorias gerais e resultados foi mobilizado como base para a construção de um painel de indicadores para medir os resultados elencados.